Da Folha de Pernambuco
Em Pernambuco, quem pega a estrada do litoral ao Sertão constata uma vegetação viva, açudes cheios, barragens sangrando. No céu, nuvens carregadas dão uma nova esperança de um período de chuva ainda mais prolongado após seis anos de uma rigorosa estiagem. Especialmente para o povo sertanejo, que convive com secas históricas desde que se tem registro, há 300 anos. O quadro geral ainda se apresenta aquém do mínimo ideal, segundo as autoridades, com base nos números que trazem muitos reservatórios em situação de colapso. Contudo, a mudança na qualidade de vida já é visível. Locais que chegaram, literalmente, ao fundo do poço, sem uma gota de água da natureza, apenas com o chão seco, mostram o reaparecimento tímido do armazenamento e de toda a vida que o cerca – plantas, animais, seres humanos; e acolá uma fartura inimaginável há até poucos meses. Uma transformação no cotidiano de milhares de pessoas, que diretamente vai do consumo doméstico a atividades econômicas como a agricultura, a pecuária, a pesca e até mesmo o turismo, e, indiretamente, pode-se dizer que é incalculável.
A Folha de Pernambuco visitou uma das principais regiões onde essa transformação se mostra latente: o Sertão do Pajeú. Do semblante dos moradores, que tratam do assunto sempre demonstrando grande satisfação, passando pela beleza dos flamboyants e ipês em flor, até as pequenas plantações de milho e palma em cada pequena propriedade. A impressão de que alguém pegou um desenho feito em grafite e o preencheu com uma aquarela. Ou como se o céu houvesse derramado na região uma paleta de cores. Até o calor parece haver entendido a proposta e se mostra mais ameno – bem diferente daquele sol quente de lascar dos idos mais áridos. Mesmo nos lugares menos beneficiados, a esperança parece algo concreto, palpável. Natural de Tabira, a agricultora Ana Maria, 56 anos, conta que foi morar com o marido e quatro de seus seis filhos em uma propriedade do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) ao lado do reservatório do Rosário, no município de Iguaraci (a 355 km do Recife), há quatro anos. Desde então, o armazenamento no local caiu, ano a ano, de 12% da capacidade para 4% em 2015 e, depois, estacionou em 0%.
As chuvas deste ano não aumentaram quase nada o nível da barragem, porém, foi suficiente para mudar a paisagem, que levou de volta a vegetação e animais de pequeno porte. E, para Ana Maria, sustentaram a roça. “Estava seco, uma situação triste”, lembra a agricultora. “Para beber águatínhamos que ir buscar longe. Botávamos água do poço, salgada [salobra]. Mas o feijão ficava duro.” Em 2017, ainda segundo Ana Maria, “deu só uma trovoadazinha”. A família plantou, entretanto, perdeu tudo. “Agora, nós temos roça. Temos quase milho verde e o feijão está querendo ficar maduro”, comemora. “Plantamos e está nas mãos de Deus. E vai chover mais, até maio”, acredita. “Este ano vai ser bom de inverno. Se Deus quiser.”