No caso das redes
municipais, a liberdade de matricular no ensino fundamental crianças que
completam seis anos após o mês de março reduz a pressão por vagas na
pré-escola. Os dados mais atuais mostram que em todo o Brasil há 510 mil
crianças de 4 a 5 anos fora da escola.
Isso ocorre porque faltam
prédios de pré-escola pelo país. Esse problema não ocorre, no entanto,
com o ensino fundamental, onde há vagas.
O presidente da Undime
(entidade que reúne os secretários municipais de Educação), Alessio
Costa Lima, diz que a decisão do STF é acertada e colabora para uma
melhor organização de todo o sistema educacional.
"Há grande
preocupação sobre esse entendimento equivocado, por parte de conselhos
[locais de educação], Judiciário, estados e municípios que não tinham
fundamentação", diz. "Essa decisão põe um ponto final nessa
divergência."
Em oito estados, a norma federal já não é seguida,
sobretudo por causa de decisões judiciais. Nesse sentido, a principal
consequência prática é uniformizar as decisões judiciais daqui em
diante.
"É uma decisão paradigmática importante, que é vinculante
para todos os tribunais", diz a advogada especialista em educação
Alessandra Gotti, presidente-executiva do Instituto Articule. Gotti foi
consultora do CNE quando essas regras foram estipuladas.
Especialistas
argumentam, com base em pesquisas, que garantir crianças com seis anos
completos até março evita uma antecipação da escolarização — uma vez que
as atividades na pré-escola são mais lúdicas e, no ensino fundamental, o
trabalho de alfabetização já é efetivo.
"Crianças mais velhas na
mesma série têm uma vantagem nas pontuações de avaliações [externas]",
explica a consultora de educação Alejandra Velasco, sócia-efetiva do
Movimento Todos pela Educação. "Isso abre brecha para a desigualdade
educacional."
O MEC também defende a medida. "Existem ciclos de
desenvolvimento e aprendizagem que não apenas orientam a definição do
corte etário para a entrada em um determinado nível da educação, mas
também a organização dos conteúdos", afirmou a pasta em nota.
Esse corte em março também é o mesmo praticado na maioria dos países do Mercosul, como afirma o MEC.
Foram
analisadas no Supremo duas ações que abordavam o mesmo tema. Uma havia
sido ajuizada em 2007 pelo governo de Mato Grosso do Sul, a favor da
norma, e outra, de 2013, pela Procuradoria-Geral da República,
contestando as resoluções do CNE.
Em maio, quando votou contra a
norma em vigor, o ministro Edson Fachin (relator de uma das ações)
afirmou que seu entendimento prestigiava o direito ao acesso à educação,
uma garantia constitucional.
"A indicação das diretrizes da
resolução do CNE, ao referir-se aos seis anos completos, não está na
Constituição brasileira e não acredito que uma diretriz operacional de
uma resolução possa mudar a Constituição", disse.
Na quarta, Fachin,
Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Dias Toffoli e Celso de Mello
consideraram inconstitucional o corte etário, que restringiria o acesso à
educação. Eles votaram por excluir da norma do CNE a expressão
"completos até 31 de março".
Mas eles foram vencidos. Os ministros
Luiz Fux (relator de uma das ações), Luís Roberto Barroso, Ricardo
Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Cármen Lúcia votaram pela
constitucionalidade das normas que exigem que a criança tenha a idade
completa para poder entrar nos ensinos fundamental e infantil.
O
ministro Marco Aurélio afirmou que os dispositivos legais que criam o
corte etário foram regularmente aprovados pelo Legislativo e por órgão
do Executivo (o CNE) composto por especialistas em educação, mediante
amplo debate e estudos técnicos.
"Não cabe ao Judiciário o exame da
controvérsia", disse, destacando que os ministros não sabem o impacto
que uma decisão contrária às normas vigentes teria nas escolas.
A
presidente da corte, Cármen Lúcia, disse que o CNE levou em consideração
as condições dos alunos nacionalmente para estabelecer o corte em 31 de
março. "E se demonstrou que haveria uma desordem dentro do sistema
educacional se não houvesse essa situação. Haveria não a organização
nacional do ensino, mas a desorganização", afirmou.
Atualmente, casos de transferências de alunos para outras cidades confrontam-se com regras diferentes.
A
rede estadual de São Paulo, por exemplo, tem duas: nas escolas da
capital paulista, o corte é de 31 de março, o mesmo da rede municipal da
capital.
Já nas unidades do resto do estado, vale 30 de junho, o que
segue norma do Conselho Estadual de Educação de São Paulo de 2015, que
contradiz a norma federal.
Escolas privadas do estado tendem a seguir
a regra do conselho estadual. No Colégio Santa Maria, na zona sul da
cidade de São Paulo, o corte etário se dá em junho.
"Há uma demanda
muito grande das famílias [para matricular antes]. Como entram crianças
mais novas, a gente faz adaptação de currículo para acolher essas
crianças, com passagens do infantil para o 1º ano do fundamental de
forma mais gradativa", diz Sueli Gomes, uma das orientadoras pedagógicas
da escola.
Após a decisão do STF, a escola afirma que pretende
rediscutir a questão, mas também vai esperar o Conselho Estadual de
Educação. A Secretaria Estadual de Educação afirma que vai realizar, em
breve, discussões com o conselho sobre isso.
Rose Neubauer, membro do
conselho e ex-secretária estadual de Educação de São Paulo, diz
concordar com o STF e esperar uma redefinição do órgão estadual. "Uma
determinação federal, em nível de Supremo, tem que ser levada em
consideração", diz.
"Houve pressão forte dos municípios e da
iniciativa privada [para o conselho estadual manter o corte em junho].
Como educadora, acredito que o STF fez uma decisão sábia." (Via:
Folhapress)
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