Atuação no ministério seguindo a Lava Jato
Moro afirmou ter
aceitado o ministério para implantar “uma forte agenda anticorrupção” e
“contra o crime organizado”. Segundo ele, a ideia é replicar no
ministério as forças-tarefas adotadas na Operação Lava Jato. Ele cita
como exemplo a atuação do FBI no combate às máfias em Nova York.
Sem
dar detalhes, Moro afirmou que apresentará uma série de propostas de
combate ao crime organizado. A ideia, diz, é resgatar parte das “dez
medidas contra a corrupção”, proposta encabeçada pelo Ministério Público
Federal.
Entre as propostas está a possibilidade de os procuradores
negociarem a pena (“plea bargain”), o que, afirma Moro, ajudaria a
aliviar a Justiça, e aumentar a proteção de denunciantes anônimos.
“A
ideia é que essas reformas sejam propostas simples e que possam ser
aprovadas em um breve tempo. Sem prejuízo de que propostas mais
complexas – e existem várias propostas um pouco mais complexas dentro
dessas novas medidas – sejam apresentadas no momento um pouco posterior
ou paralelamente. Mas a ideia é apresentar alguma coisa simples e de
fácil aprovação no âmbito do Congresso.”
Convite de Paulo Guedes
O
juiz afirmou ter sido procurado em 23 de outubro por Paulo Guedes
(futuro ministro da Fazenda). Segundo o relato, o encontro ocorreu
depois da retirada do sigilo da delação de Palocci.
No encontro,
antes do segundo turno das eleições presidenciais, ele foi sondado sobre
uma participação no governo. Moro contou que em 1º de novembro se
encontrou com Bolsonaro. Segundo Moro, não foram estabelecidas condições
para aceitação do convite.
Atuação como técnico, não como político
Questionado
sobre assumir uma função política, Moro reiterou que se vê como um juiz
atuando em uma função técnica à frente do Ministério da Justiça e da
Segurança Pública. “Eu não creio que contrariei uma afirmação que fiz há
anos, ao ‘Estado de S. Paulo’, de que jamais entraria na política”,
responde ele.
“Na minha perspectiva, na minha visão, eu sigo para
atuar em uma função técnica, pra fazer um trabalho técnico de um juiz a
cargo desse ministério específico. Não tenho nenhuma pretensão de
concorrer em qualquer momento da minha vida a cargos eleitorais, a subir
em palanque”, disse Moro.
“Eu, como disse, tomei a decisão que me
pareceu melhor para buscar a consolidação desses avanços dos últimos
anos em relação à corrupção. E nós não corrermos um risco de
retrocesso.”
Integrantes do ministério
Moro disse que
pretende chamar nomes que trabalham ou trabalharam na Operação Lava Jato
e substituir cargos de comissão por cargos concursados.
“Pretendo
chamar ao ministério pessoas absolutamente qualificadas e, sim, nomes
que trabalharam na Operação Lava Jato, tanto por terem sido testados por
sua eficiência, quanto por sua integridade. As indicações virão a seu
tempo.”
Perseguição política
“Não existe a menor chance de
utilização do ministério ou da polícia para perseguição política. Não
foi feito isso durante a Operação Lava Jato. As pessoas foram condenadas
com base em crime de corrupção, de lavagem de dinheiro e associação
criminosa. Com base em provas robustas e não por suas opiniões
políticas. Não vai ser no ministério que eu vou começar a realizar
isso”, afirmou Moro.
Sobre o processo contra o ex-presidente Lula,
ele disse que a condenação à prisão não teve nenhuma relação com as
eleições. “O que existe é um crime que foi descoberto, investigado e
provado e as cortes apenas cumpriram a lei. Não posso pautar minha vida
num álibi falso de perseguição política.”
Caso Marielle
O
futuro ministro também mencionou o assassinato da vereadora Marielle
Franco, do Rio de Janeiro, e seu motorista Anderson Gomes, em 15 de
março. “Não desconheço o problema que envolve o assassinato da
ex-vereadora Marielle Franco e do senhor Anderson Gomes”, disse ele.
“Eu
acho que é um crime que tem que ser solucionado. Eu, assumindo o
ministério, pretendo me inteirar melhor dessas questões e ver o que é
possível fazer no âmbito do ministério.”
Redução da maioridade penal
Moro
entende ser “razoável” e se disse favorável à redução da maioridade
penal para 16 anos em casos de crimes de graves contra a vida, que
resultem grave lesão corporal ou crime de estupro.
“Pra esse tipo de crime, um adolescente de 16 anos tem plenas condições de responder pelos seus atos”, disse Moro.
Flexibilização da legislação de armas
O
futuro ministro foi questionado sobre a flexibilização do uso de armas,
e sinalizou ser favorável à flexibilização da legislação, bandeira
defendida na campanha por Bolsonaro. Mas ponderou que “uma
flexibilização excessiva pode ser utilizada como armamento para
organizações criminosas”. “Tem que pensar quantas armas o indivíduo
poderá ter em sua casa”, disse Moro.
“Conversei a respeito com o
presidente eleito e existe uma plataforma na qual ele se elegeu que
prega a flexibilização da posse de armas. Então, dentro dessa plataforma
eleitoral, parece que seria inconsistente agir de maneira contrária”,
afirmou o juiz.
Confrontos policiais
Para Moro, a
estratégia tem que ser evitar qualquer espécie de confronto policial e
“danos colaterais”. “A nossa legislação, ao meu ver, já contempla essas
situações de legítima defesa, estrito cumprimento de dever legal. Tem
que ser avaliado, no entanto, será necessária uma regulação melhor”. O
futuro ministro disse acreditar que confrontos são situações limites.
“Por
exemplo, é necessário que o policial espere que um traficante armado
atire contra ele de fuzil, pra que ele possa reagir? Me parece que
exigir isso de um agente policial é demais. O risco de ele morrer é
muito grande”, disse Moro.
Progressão de pena
Moro afirmou
que o regime penal tem de ser mais rigoroso em alguns casos, e que o
tema requer discussão. “Acho que se barateia a vida quando se tem
progressão [de pena] muito generosa”, diz Moro.
Ele defendeu a medida
como forma de ressocializar o preso. “Isso é muito importante, mas se
existem provas de que o preso mantém vínculos com organizações
criminosas, isso significa que ele não está pronto para a
ressocialização. A ideia aqui é servir de incentivo para que os presos
se abstenham de se afiliar a organizações criminosas, e também
enfraquecer essas organizações e proteger a comunidade da soltura de um
preso que não está pronto para a ressocialização.”
Movimentos sociais x terrorismo
Moro
apontou que os movimentos sociais não são inimputáveis, devem responder
por danos causados a terceiros, mas qualificá-los como terroristas “não
é consistente” e “não se tem intenção de criminalizar manifestações
sociais”.
Policiais disfarçados
Outro ponto levantado pelo
futuro ministro da Justiça e da Segurança Pública é esclarecer a lei
brasileira sobre a atuação de policiais disfarçados, para que a polícia
possa atuar de forma semelhante ao modelo americano. “Isso se faz muito
nos Estados Unidos com grande eficácia contra organizações criminosas: a
utilização de policiais disfarçados para descobrir esses crimes”, disse
ele citando o exemplo de “policiais disfarçados comprando grandes
carregamentos de drogas e armas”.
“A nossa legislação, embora na
minha opinião permita este tipo de comportamento, ela não é assim
totalmente clara. E é importante deixar isso de uma maneira mais clara.”
Investimento em tecnologia
O
futuro ministro defendeu “investir consideravelmente em tecnologia”
para melhorar os índices de elucidação de crimes e as técnicas de
combater o crime organizado, inclusive dentro da prisão.
Segundo
Moro, é necessário incrementar o controle das comunicações dos presos em
presídios de segurança máxima. “Como no exterior, a prisão tem que
realmente limitar a possibilidade de essas pessoas comandarem o crime de
dentro. Precisa investir consideravelmente em tecnologia”, disse ele.
O
DNA também é uma aposta dele. “Nós temos uma lei hoje no Brasil que
autoriza a colheita do perfil genético do preso, que é como se fosse uma
moderna impressão digital, o DNA. Essa é uma prova revolucionária pra
identificação de crimes praticados com grave ameaça à pessoa. Em países
que desenvolveram esse banco de dados, isso serve não só para elucidar
crimes, mas pra exonerar inocentes às vezes condenados por crimes
judiciários. Nós temos, no entanto, apesar da lei, uma colheita muito
tímida deste tipo de material. Então eu quero desenvolver uma política
agressiva – agressiva não quer dizer violenta, evidentemente –, mas pra
aumentar essa base de dados, que certamente vai resultar em melhores
estatísticas para a elucidação de crimes no Brasil, que são muito
baixas.”
Mudanças no Coaf
Moro afirmou que o Ministério da
Justiça é o local adequado para se discutir mudanças no Conselho de
Controle de Atividades Financeiras (Coaf), atualmente vinculado ao
Ministério da Fazenda. “É preciso reestruturar o Coaf e fortalecer o
Coaf”.
Na avaliação dele, o futuro ministro da Economia, Paulo
Guedes, estará muito ocupado com as questões ligadas à economia e o Coaf
não deve ser um foco de preocupação dele. Por isso, de acordo com Moro,
o local mais adequado para se discutir o Coaf seria o Ministério da
Justiça.
Ele mencionou que não haverá interferência política no
ministério e que esta também é uma posição de Jair Bolsonaro, que jamais
aceitaria, segundo Moro, proteção a ninguém.
Indicação ao STF
Perguntado
se impôs ao presidente eleito, como condição para assumir o ministério,
a indicação a uma vaga no Supremo Tribunal Federal, Moro negou a
condicionante, mas disse que a discussão sobre vagas que eventualmente
surgirem no futuro deve ser feita em outro contexto.
“A pergunta é
bastante pertinente, mas eu não estabeleci condições. Eu fui conversar
com o presidente eleito com uma pauta para nós sabermos onde teríamos
convergências e onde teríamos divergências superáveis, certo? Eu jamais
procuraria o presidente eleito e estabeleceria condições pra assumir
cargo público”, respondeu Sergio Moro.
Ele disse que, atualmente, não
acha apropriado discutir sobre vagas no STF, já que não existe nenhuma
aberta. “No que se refere ao Supremo Tribunal Federal, não existe uma
vaga no momento e não faço aqui nenhum juízo de censura à sua pergunta,
mas não acho aqui apropriado a discussão a respeito de uma vaga no
Supremo Tribunal Federal atualmente”, disse.
Possíveis divergências com Bolsonaro
Moro
afirmou que podem ocorrer divergências entre ele o presidente eleito e
que isso é normal. “Vejo com absoluta naturalidade”. Segundo ele, a
conversa que teve com Bolsonaro “foi bastante produtiva” e que houve
“algumas divergências razoáveis”. “É possível que cheguemos a um meio
termo”, disse.
O juiz também apontou que não tem dúvida de que a
decisão final é do presidente. “Eventualmente, a melhor decisão pode ser
a dele”, afirmou.
Sobre sua avaliação pessoal do novo presidente,
Moro disse que o considera moderado. “A minha avaliação que eu tenho do
presidente eleito é que é uma pessoa moderada. Inclusive essa própria
conversa pessoal me mostrou mais claramente isso. O presidente eleito
inclusive moderou o discurso durante as eleições e tem as suas
manifestações recentes apresentado esse discurso mais moderado.”
Democracia e Estado de direito
O
futuro ministro disse, ainda, que não vê risco à democracia e ao Estado
de direito. “Eu não vejo em nenhum momento um risco a democracia e ao
Estado de direito”, reiterou Moro.
“No entanto, a afirmação que fiz é
que existem alguns receios a meu ver infundados, e a minha presença no
governo também pode ter um efeito salutar de afastar esses receios
infundados, porque afinal de contas eu sou um juiz, sou um homem de lei,
então eu jamais admitiria qualquer solução que fosse fora da lei, como
também o presidente eleito. Mas às vezes para convencer as pessoas é
preciso reformar o momento.”
Juíza substituta
Ao comentar
sobre a juíza Gabriela Hardt, que o substitui provisoriamente na
Operação Lava Jato, Moro disse que ela é “absolutamente preparada”.
“É
uma pessoa competente, íntegra. Ela não é uma juíza que surge agora.
Ela já tem um longo histórico na justiça federal, com casos processuais
relevantes”, afirmou. Ele disse ainda que não se sentiria confortável de
deixar a operação se os processos não ficassem “em boas mãos”.
Entenda a nomeação
Moro
abandonou a carreira de juiz federal para ser ministro da Justiça do
governo do presidente eleito. Na segunda-feira (5), ele comentou a
decisão de deixar a magistratura e disse que não se vê “ainda como um
político verdadeiro”. Na avaliação dele, o cargo é predominantemente
técnico.
Moro se afastou das atividades de juiz federal e da Lava
Jato logo após aceitar o convite para ser ministro. Em ofício, ele
comunicou que vai sair de férias por 17 dias a partir desta segunda e
que vai pedir a exoneração da magistratura em janeiro.
Com a saída de
Moro, a juíza Gabriela Hardt, substituta da 13ª Vara Federal de
Curitiba, fica à frente dos processos da Lava Jato interinamente, até
que seja escolhido um novo responsável.
Reproduzido por Blog Tv Web Sertão
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