Começam testes da transposição do São Francisco, mas ainda falta água


Começam testes da transposição do São Francisco, mas ainda falta água

Ação começa quatro anos depois do prazo dado para conclusão da obra.
Previsão para término no momento é final de 2015, com custo de R$ 8,2 bi.
Estação de Bombeamento 1 do Eixo Leste já funciona em caráter de teste (Foto: Katherine Coutinho / G1) 
Estação de Bombeamento 1 do Eixo Leste já funciona em caráter de teste 
(Foto: Katherine Coutinho / G1)
"Só vou acreditar quando sair mesmo a obra. Se chegar mesmo água aqui, o Nordeste vai virar Sul. Vai ser muito bom para a gente aqui, o povo só não trabalha porque não tem água", afirma o mototaxista Geneci Batista, que se mostra cético ao projeto de transposição das águas do rio São Francisco. Em outubro deste ano, começaram os testes no primeiro trecho de canais, quatro anos depois do prazo fixado para a conclusão das obras.
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Os canais que saem do Velho Chico somam, juntos, 477 quilômetros. O objetivo, segundo o Ministério da Integração, é levar água a cerca de 12 milhões de pessoas em Pernambuco, na Paraíba, no Ceará e Rio Grande do Norte. A previsão é atingir mais de 390 municípios no sertão pernambucano, além de 325 comunidades que residem a uma distância de cinco quilômetros da margem dos canais.
Esse primeiro teste ocorreu na estação 1 do Eixo Leste, em Floresta (PE). A água da Barragem de Itaparica é bombeada até a Barragem de Areias, a primeira das 27 previstas na região. Apesar disso, a população do entorno da obra no sertão pernambucano ainda não tem acesso à água que corre pelo canal. Isso deve ocorrer após a conclusão dos testes, previstos para ocorrer até o fim do ano.

Transposição do São Francisco (Foto: Arte G1)
Ao todo, são cerca de 11 mil funcionários que trabalham no projeto de transposição do São Francisco atualmente. O G1 percorreu 2.500 quilômetros, pelas cidades de Sertânia, Custódia, Floresta, Salgueiro e Cabrobó, em Pernambuco; Monteiro e São José de Piranhas, na Paraíba; além de Jati, Mauriti e Brejo Santo, no Ceará.
Em 2012, as obras foram praticamente paralisadas devido a problemas com as construtoras e desentendimentos sobre valores de contratos. Questões como a perfuração de solos com constituição mais dura do que o previsto afetaram o andamento das obras e o orçamento.  Novas exigências do Ibama representaram quase R$ 1 bilhão a mais, valor não previsto inicialmente.
O orçamento passou de R$ 4,8 bilhões para R$ 8,2 bilhões e agora, segundo o Ministério da Integração Nacional, a transposição só deve ser finalizada em dezembro de 2015. A conclusão está próxima de 70% do total, segundo a pasta.
Quando ocorreu a paralisação das obras, os sertanejos chegaram a temer que a Transposição não fosse concluída. Com o atual ritmo, pessoas como o comerciante Mauro Barbosa esperam que secas extensas não sacrifiquem tanto a população.
"Gastar o que se gasta com carro-pipa... É melhor uma obra dessas mesmo. Tem muita gente precisando. Tendo água, tem comida", acredita Barbosa, morador de Monteiro.
Alguns trechos da Transposição do São Francisco contam com obras 24h por dia (Foto: Katherine Coutinho / G1) 
Alguns trechos da Transposição do São Francisco contam com obras 24h por dia (Foto: Katherine Coutinho / G1)
O túnel de Monteiro, que fica entre a cidade na Paraíba e Sertânia (PE), é um dos que segue em ritmo intenso de obra. Com 3 quilômetros de extensão, a rocha está sendo perfurada em um ritmo de dois a quatro metros por dia, de acordo com o tipo de material encontrado. Próximo, em Sertânia, a Barragem de Barro Branco ergue seu vertedouro e vai acertando o terreno, já desmatado.
O São Francisco terá água para todos?
Apesar de o Ministério da Integração afirmar que a Transposição não afeta o rio em si, moradores do entorno da obra seguem preocupados. A gestora de uma escola pública municipal em Floresta (PE), Rosângela de Souza, teme pelo futuro do curso d'água, especialmente devido à seca prolongada
"A gente vê a situação do Rio São Francisco ir se agravando, fica muito preocupado. Como ele vai aguentar dar água para tanta gente se está ficando seco aqui? Se estivesse chovendo, tudo bem", avalia.
Túnel de Monteiro avança de dois a quatro metros por dia (Foto: Katherine Coutinho / G1) 
Túnel de Monteiro, cidade na Paraíba (Foto: Katherine Coutinho / G1)
Preocupação semelhante tem a auxiliar de cozinha da escola, Marizete Isidoro. Moradora há quase 30 anos da Agrovila 6, em Floresta, ela conta que o problema de água da comunidade foi resolvido com poços furados pelo Exército. "Fazer tanto poço assim pode não ser bom. Se não chover, como vai ter água no lençol freático? Vai ficar todo mundo sem água do mesmo jeito. O rio São Francisco só está de pé por causa dos afluentes, mas a seca está grande, a gente se preocupa", conta.
O engenheiro agrônomo João Suassuna é especialista em convivência com o Semiárido e há 20 anos estuda o rio como pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco. Para ele, a população tem razão em ficar preocupada com a Transposição. "O São Francisco não vai ter volume para atender tudo isso que estão querendo fazer com ele. Esse é o caminho mais curto para terminar de exaurir o rio", opina.
Suassuna explica que o rio é de múltiplos usos. "Cerca de 95% da energia no Nordeste é proveniente dele. Existe uma área irrigável importante, de 1 milhão de hectares, na beira do rio, dos quais 340 mil hectares já estão irrigados e levam um volume importante das águas. Já está havendo um conflito enorme entre gerar energia e irrigar", argumenta.
Marizete Isidoro (Foto: Katherine Coutinho/G1) 
Marizete Isidoro diz que se pergunta se o São Francisco terá água disponível (Foto: Katherine Coutinho/G1)
"A nascente do Rio São Francisco [em Minas Gerais] chegou a secar. Em regiões como Pirapora, São Francisco e Januária, o rio está praticamente seco. Já há uma limitação de volumes séria e você querer tirar mais volume para abastecer 12 milhões de pessoas e ainda irrigar 300 mil hectares? Isso é fisicamente impossível", sentencia.
Para ele, cabe aos técnicos fazer com que essa água tenha um bom uso no futuro. "Uma equipe de hidrólogos tem que cair em campo para avaliar as reais necessidades hídricas. O que tem de informação sobre volumes circulando hoje é chute. Eles precisam determinar um número real a partir do qual quem tiver gerenciando essa 'torneira' do São Francisco vai ter que obedecer", sugere. Suassuna também defende que abastecimento de água passe a ser considerado assunto de segurança nacional. "Tem que ser entregue à Polícia Federal [esse controle], não pode ter interferência política nesse tipo de decisão", disse.
Canal de acesso leva água da barragem de Itaparica até a Estação de Bombeamento 1 do Eixo Leste (Foto: Katherine Coutinho / G1) 
Canal de acesso leva água da barragem de Itaparica até a Estação de Bombeamento 1 do Eixo Leste (Foto: Katherine Coutinho / G1)
Mato em lugar das obras
Apesar de estar aparentemente em curso, em Sertânia, no sertão de Pernambuco, o G1 encontrou um ponto da obra onde não há sinal de trabalhadores. Apenas um vigia toma conta da entrada do canteiro de obras da estação de bombeamento 6 (EBV6), uma das seis previstas para o Eixo Leste, que começa em Floresta, na mesma região, e vai até Monteiro, na Paraíba, de onde as águas seguem pela força da gravidade pelos rios e não mais por canais.
O mato toma conta do espaço e é possível ver caixas com inscrições do Ministério da Integração. Há peças de um pórtico rolante, equipamento e objetos pesados, como as bombas da estação. Algumas lonas rasgadas deixam os equipamentos expostos. São ao menos dois anos sem trabalho no local.
Em Maurit (CE), é possível encontrar trechos do canal em diferentes fases da construção (Foto: Katherine Coutinho / G1) 
Em Mauriti (CE), é possível encontrar trechos do canal em diferentes fases da construção (Foto: Katherine Coutinho / G1)
A explicação dada pelo Ministério da Integração é que as obras seguem em ritmo mais acelerado onde estão mais próximas da água. O Eixo Norte, que vai de Cabrobó, no Sertão de Pernambuco, até Cajazeiras, no Ceará, conta com três estações de bombeamento ao longo do percurso. Juntos, os dois eixos da Transposição vão contar com 27 reservatórios construídos, além de 23 açudes que devem ser reformados para também integrar o sistema hídrico. Ainda há quatro túneis.
Para cumprir os prazos, alguns trechos, especialmente no Eixo Norte, contam com turnos de trabalho inclusive durante a noite, como é o caso da Barragem de Porcos, em Brejo Santo. Os serviços de concretagem são geralmente deixados para a noite, para evitar problemas e rachaduras, uma vez que o sol intenso altera o tempo de cura do concreto.
Katherine Coutinho Do G1 PE 

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