Em meio a tantas dúvidas que o
vírus da zika e os casos de
microcefalia suscitam na população, e enquanto a relação definitiva entre ambos não é oficialmente mostrada por "A + B", boatos dos mais diferentes tipos e origens ocupam as rodas de conversas nos cafezinhos e se multiplicam em redes sociais.
Do produto usado no combate às larvas do Aedes aegypti a supostas vacinas vencidas aplicadas em gestantes, passando pelo registro de
3.000 grávidas infectadas na Colômbia sem nenhum caso de microcefalia, a desinformação avança em velocidade comparável ao vetor da doença.
O mais recente rumor ganhou notoriedade na última semana quando o governo do Rio Grande do Sul suspendeu o uso de um larvicida após um relatório de um grupo argentino apontar a possibilidade de a substância potencializar a má-formação cerebral causada pelo vírus da zika.
O documento cita nota da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) que alerta para o uso contínuo de larvicidas, sem relacionar a má-formação ao produto. Na segunda (15), a entidade negou que tenha feito tal relação.
Na Colômbia, o governo afirmou que não há casos de bebês com microcefalia entre as mais de 3.000 gestantes infectadas por zika. Porém, dados apurados pela Folha mostram que só 10% delas já tiveram seus filhos (ou seja, é cedo para conclusões porque a microcefalia só é diagnosticada com a gravidez avançada).
No final de 2015, começaram a circular mensagens de áudio com informações supostamente repassadas por especialistas. Elas diziam que o vírus da zika deixaria sequelas neurológicas não só em bebês, mas em crianças com menos de sete anos.
Segundo o infectologista Artur Timerman, o vírus pode deixar sequelas, mas é raro e acontece com um número pequeno de pacientes, independentemente da idade. Para desenvolver algum problema é preciso que a imunidade esteja baixa, ele diz.
O Aedes aegypti é o vetor de três doenças: dengue,
chikungunya e zika. E a infecção pelas três ao mesmo tempo, como no suposto caso de um colombiano, seria possível?
Infectologistas acham muito improvável. O secretário da Saúde de São Paulo, David Uip, relata ter recebido um paciente com sorologia positiva para as três doenças. No final da investigação, porém, ele só tinha chikungunya.
Uip explica quer ao fazer exames para as outras arboviroses, eles podem dar um resultado falso positivo. Ou seja, há uma reação cruzada.
Para o virologista Gubio Soares, da Universidade Federal da Bahia, foi o que provavelmente houve na Colômbia.
VACINASAs vacinas não escaparam dos boatos. Um deles diz respeito a gestantes imunizadas contra a rubéola inadvertidamente no Nordeste, outro é sobre lotes vencidos do produto e uma terceira versão, sobre a dTPA (contra coqueluche, difteria e tétano, aplicada no último trimestre de gestação).
"Cada hora é uma vacina. É enlouquecedor. Não adianta apresentar evidência de que são seguras, há pessoas que ainda continuam acreditando", diz Isabella Ballalai, presidente da SBIn (Sociedade Brasileira de Imunizações).
Sobre a vacina da rubéola, Isabella diz que, em primeiro lugar, a vacina não é dada a gestantes. Segundo ela, na última campanha de vacinação, algumas mulheres tomaram a vacina sem saber que estavam grávidas, mas mesmo assim não houve dano ao feto.
Há uma versão segundo a qual foram distribuídos lotes de vacinas vencidas. "Não existe isso, as vacinas distribuídas pelo governo são seguras. E mesmo que isso tivesse acontecido, ela simplesmente perderia o efeito e deixaria de proteger, nunca causaria má-formação no feto", diz.
Por fim, a dTPA. "A vacina é segura e aplicada no mundo todo, a do SUS é igual à da rede privada. Ela é aplicada em vários lugares do mundo e já existem resultados muito bem documentados de que ela diminui a morte e a hospitalização de bebês por coqueluche", afirma Isabella.
A disseminação de boatos sobre vacinas é histórica e vem desde a Revolta da Vacina, quando Oswaldo Cruz tornou obrigatória a vacinação contra a febre amarela.
"Na época, existia um descontentamento com o governo bastante grande, como hoje. É fácil o brasileiro acreditar que o governo distribuiu uma vacina vencida com tantas coisas que estamos vendo", diz Isabella Ballalai.
"Esse descontentamento é um campo fértil para implantar e disseminar esses boatos."
MITOS E VERDADES SOBRE O ZIKA: